liberdade: poder do piroso . poder da fé

liberdade

6.11.08

poder do piroso . poder da fé

ainda bem que caminhamos a passos largos para um mundo em que fundamentalismos, o “politicamente correcto” de alguns e os “pudores” de outros, deixam de fazer sentido. um dia, certamente, as máscaras que carregamos (uns mais do que outros), associadas aos papeis que representamos, poderão desaparecer. é tempo de subjectividade, de emoção, de diferença, de tolerância, de diversidade, de genuíno, de aceitação, do todo, de visão, de todos e de cada um, …de verdade. depois, inevitavelmente virá a responsabilidade individual, e aí seremos muitos, e vai ser bom. quando era pequena uma amiga/prima com quem brincava muito, pediu-me que lhe explicasse o que é queria dizer piroso… na realidade algumas/poucas pessoas começavam a utilizar esta palavra que basicamente não quer dizer nada, de tão subjectiva que é a base, em que se fundamenta o conceito estético que está por detrás dela. apesar disso nós-os-iluminados utilizávamos o termo com alguma soberba e poder, de quem sabia, de quem podia… eu tinha uns 10 anos, acho, e vi-me em sarilhos na tentativa da explicação, restou-me o poder… mas ela era minha amiga e então resolvi abrir mão do meu "estatuto" e propor-lhe um “negócio” com uma palavra que sempre me fascinara e que não controlava: - eu tento arranjar maneira de te explicar o que significa piroso, disse-lhe eu. - e tu tentas explicar-me o que significa (sou filha de pais ateus).
… - então…, sabes logo, se é piroso… é de mau gosto… é ridículo de feio!…, comecei eu. - mau gosto? … mas eu gosto! ridículo porquê? para quem?, perguntava ela. - para nós os do nosso género!…, os que dizemos piroso! olhamos e sabemos logo!, exclamei eu. - não vês que quem percebe mais disso dos gostos, diz que é feio, ridículo de feio, piroso!, continuei. - e quem são esses?, perguntou. - sei lá, arquitectos, pintores, escritores, artistas, amigos nossos..., disse eu também baralhada com as perguntas, com a questão… - sabemos, olhamos e vemos que é! não sei explicar olha-se e está à vista de “todos” é piroso!, exclamei. - mas eu acho giro!…? … - e fé, é o quê?, perguntei depois eu. - então, fé é acreditar em Deus… mesmo que nunca o tenhamos visto. eu sei que existe! é a fé! tenho fé!, respondeu ela contente por agora ser a sua vez. - não sabes nada! se existisse, havia provas. como é que é possível saberes o que não sabes sem provas? e se não tens provas…, desesperei eu. - tendo fé! fé é isso mesmo, acreditar sem precisar de ter provas, continuou ela. - que parvoíce! não acreditas no que estás a dizer, pois não?, suspirei frustrada. andámos nisto algum tempo. cada uma ficou com o seu poder e seguimos em frente pela vida fora.
... hoje o termo piroso entrou em desuso e está praticamente extinto. claro que o conceito de mau gosto continua a existir, impermanente, volátil, cíclico, subjectivo, humano… mas acima de tudo com o piroso foi-se o poder. já a fé… não vai de modas neste mundo do diverso, que se quer de tolerância, e largou as vestes de Deus quando a reconhecemos também, enquanto característica e possibilidade humana. podemos chamar-lhe o que quisermos, optimismo, romantismo, coragem, defesa, sonho, espiritualidade, resiliência, ou mesmo consequência do medo, da solidão…
eu entretanto, aprendi a reconhecer a fé, também como condição/possibilidade minha (bem me parecia que era importante!). a verdade é que a fé, enquanto capacidade de sentir o que aparentemente não podemos ver, é poderosa e será sempre o que nos fará mover, viver.